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* DOS SANTOS: "COMEÇAMOS A CONSTRUIR UMA CULTURA DE AVALIAÇÃO UNIVERSITÁRIA"
* SOBRE O FINANCIAMENTO DAS UNIVERSIDADES PORTUGUESAS

DOS SANTOS: "COMEÇAMOS A CONSTRUIR UMA CULTURA DE AVALIAÇÃO UNIVERSITÁRIA"

Brandão e Marín. Unv. Granada. / O Presidente do Conselho de Reitores de Portugal e Reitor da Universidade do Minho, Prof. Dr. Sérgio Machado dos Santos, participou da reunião de reitores das Universidades de Portugal e Espanha, celebrado em Cádiz, por ocasião do Salão Internacional do Estudante.

Presidente do Conselho de Reitores de Portugal

Em sua exposição na reunião entre reitores portugueses e espanhóis, abordou a situação atual das Universidades portuguesas. Poderia resumir sua intervenção?
A partir do momento histórico para o ensino universitário português, que foi a aprovação da Lei da Autonomia das Universidades, em 1988, tratei das potencialidades que foram introduzidas, dos efeitos benéficos que trouxe ao sistema, das dificuldades que também se criaram, de alguns bloqueamentos que, nesse momento, estão identificados e que vão conduzir a um estudo que o próprio Conselho de Reitores de Portugal está a efetuar, no sentido de sugerir algumas alterações à própria Lei da Autonomia.
Aproveitei também para apresentar com dados concretos o que tem sido a expansão do sistema, portanto, a massificação, o crescimento exclusivo em termos de número de alunos, de novos lugares e de novas instituições, fazendo ressaltar o aspecto binário do sistema de ensino superior em Portugal: o ensino universitário e politécnico.
Por outro lado, mencionei também o fenômeno recente do aparecimento de um setor privado muito forte, em termos de número de vagas, de novos lugares que são criados todos os anos, mas pouco suportáveis em termos de infra- estrutura, principalmente em recursos humanos, constitui uma das principais preocupações do ensino superior em Portugal, e portanto, procurei apresentar um pouco essa panoràmica, antes de passar a temas mais concretos como avaliação, financiamento ou cooperação.
A respeito da avaliação das Universidades, qual é a situação atual em Portugal?
Em minha intervenção não entrei nos aspectos teóricos da avaliação. Essa fase nós já ultrapassamos em Portugal, há cerca de dois anos, numa grande discussão que envolveu todas as Universidades e que procurou ser essencialmente mobilizadora, sensibilizadora para o problema. Começamos a construir, o que entendíamos que existisse, uma cultura da avaliação, assumida mesmo pela Universidade, por todas as pessoas que nela trabalham. Preocupei-me mais em apresentar alguns aspectos históricos que levaram à aprovação da Lei da Avaliação pelo Parlamento, onde o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas teve um papel predominante. Porque nós, face a uma certa paragem no país e à urgência dessa questão, tomamos a iniciativa de elaborar estudos, fazer documentos e enquadramentos em termos de princípios. Fizemos mais de uma proposta concreta para um projeto de lei para o Parlamento, e a lei que finalmente foi aprovada, contém mais de 90% de nossas propostas.
Para isso nos documentamos muito bem, trabalhamos muito de perto com especialistas do país que está mais avançado sobre essa matéria, que é a Holanda. Fizemos uma série de seminários com a ajuda de especialistas da VSNU (Associação das Universidades Holandesas e que neste país é responsável pela organização do processo de avaliação).
Depois, o próprio conselho de Reitores lançou o que nós chamamos de uma experiência piloto. Começamos mesmo a fazer a avaliação com base no modelo holandês, em cinco áreas científicas, justamente em 93 e 94. Estabelecemos protocolos próprios para fazer aquela auto- avaliação, não numa cópia fiel dos protocolos holandeses, mas a partir deles e adaptando-os à realidade portuguesa. Quando a lei foi publicada, esta experiência piloto foi integrada na própria lei. E como a lei prevê a avaliação em seis fases, em seis anos avaliam-se todos os cursos e no sétimo se retorna ao curso inicial, nossa experiência piloto constitui a avaliação do primeiro ano.
Nesse momento está completa essa primeira fase, quer em termos de avaliação interna, quer em termos de avaliação externa. No segundo conjunto de cursos já foi concluída a avaliação interna, auto-avaliação, e vai começar agora a externa. Está um terceiro conjunto, um terceiro ano com auto-avaliação bastante avançada, e nos próximos três anos fecharemos este ciclo. Em dezembro de 1999, todos os cursos das Universidades Públicas Portuguesas estarão avaliados. No ano 2000, estaremos a iniciar o segundo ciclo, retomando outra vez este processo.

É possível comparar os resultados dessa avaliação com avaliações similares de caráter europeu?
Vamos falar em termos de metodologia de avaliação, porque em termos de resultados estamos a concluir a avaliação externa do primeiro conjunto de cursos. Os relatórios estão a ser finalizados, ainda não foram tornados públicos, de modo que em termos de resultados da avaliação não temos ainda dados concretos. Mas em termos das metodologias de avaliação, nós o que estamos a fazer é muito próximo do que se faz em vários outros países. Estamos também a acompanhar outras experiências pilotos no país, por exemplo, o Conselho dos Reitores Europeu (CREU) está a lançar projetos internacionais de avaliação e institucional ao nível da gestão.
Nós tivemos no primeiro grupo a Universidade do Porto. Agora há um segundo grupo a ser avaliado na Universidade de Aveiro. Houve uma experiência piloto da Comissão da União Européia, onde nós também tivemos duas universidades inseridas e, por iniciativa holandesa, foi feita uma outra experiência não institucional, entre Universidades convidadas de Inglaterra, Alemanha, Holanda, e Portugal entrou também nessa experiência. Nós temos acompanhado muito de perto o que se está a fazer em nível Europeu, porque nessa fase nos preocupa mais a maneira de fazer, portanto as metodologias para aprendermos, depois os resultados virão naturalmente.

O sistema universitário português, como o espanhol, tem sofrido um processo de crescimento muito grande nos últimos anos. Como se desenvolve atualmente o sistema em Portugal?
O sistema tem crescido muito, o próprio sistema público tem estado num crescimento contínuo, embora moderado, entre os 5 e 7% ao ano. O fenômeno recente do desenvolvimento do ensino privado foi muito mais brusco. Neste momento, na faixa etária dos jovens entre vinte e vinte e quatro anos, 34% estão a freqüentar o ensino superior. Há quinze anos atrás era 8 ou 10%. Portanto, um jovem em cada dez freqüentava a Universidade e agora um em cada três.
Obviamente que existem problemas tremendos na Universidade. Nós deixamos de ter uma elite de estudantes para ter uma Universidade de massas, e uma das conseqüências disso é o grande desenvolvimento da pós- graduação, que aparece agora a marcar a diferença em termos de algum elitismo. A formação inicial é uma formação de massas, e a pós- graduação é onde os melhores alunos vão buscar marcar a sua diferença.

O financiamento de uma instituição como a sua procede basicamente do governo. Qual a situação geral da Universidade portuguesa quanto ao financiamento privado?
é importante distinguir aqui três aspectos dentro da Universidade. Primeiro o ensino. Neste aspecto dos programas de estudos formais que conduzem a um grau de licenciatura ou a um grau de mestre, o financiamento só tem duas vias possíveis: ou vem do Estado, do governo ou os alunos pagam taxas. Em Portugal as taxas deram um problema muito grave e agora, por razões políticas, foram outra vez abolidas. Há novamente a esperança de que elas venham, mas esse é um problema político. A definição nos termos da Lei de Autonomia não compete às Universidades, compete ao Estado, ao governo, e é difícil que uma empresa pública ou privada vá ajudar a fazer a formação inicial. Essa ou é o Estado ou o Estado e mais a família, o aluno, através de taxas.
Outro aspecto é a investigação. A investigação tem que ter um duplo financiamento. Nós em Portugal não temos empresas com dimensão em nível multinacional que possam investir na investigação de médio a longo prazo, portanto essa tem que ser suportada pelo governo, quer diretamente, quer através de programas da comunidade de apoio à própria investigação. Depois, a investigação aplicada, a investigação para o desenvolvimento. Aí as universidades começam a ter muitos contratos concretos com empresas ou com o própio Estado, ou concorrendo a programas de financiamento por programas de investigação, conforme a capacidade que mostram, nomeadamente programas da União Européia, onde começam a captar verbas muito significativas.
Nesse momento, a verba do Ministério de Educação para o ensino paga o salário dos docentes que são os investigadores. Não nos esqueçamos que à parte dos salários, não obstante, entra muito mais dinheiro por contrato de investigação do que dinheiro direto para financiamento de investigação básica.
Depois, há a prestação de serviços especializados à comunidade envolvente. Essa não pode gastar recursos do Estado, tem que ser auto- financiável e é realmente auto-financiável, paga-se a si mesma.

Reitor da Universidade do Minho

Universidade do Minho. Instituição Pública. Fundação: 1974. Sedes em Braga e Guimarães. Número de estudantes: 12.500.
Número de professores: 900. 42 licenciaturas e 110 cursos em nível de pós- graduação. Redes das quais participa: Grupo de Compostela, Erasmus, Convênios com Universidades Brasileiras e de Ibero-América.

Como definiria sua Universidade no sentido das Relações Internacionais e seus objetivos?

Como uma Universidade de um país membro da União Européia, nossa primeira prioridade está claramente em termos de integração européia, em redes, não só por uma razão de princípio, mas também porque a captação de apoios comunitários para a investigação e mobilidade estão concentrados nessa rede a nível de Universidades Européias. E aí ressalto muito essencialmente os programas transfronteiriços entre Portugal e Espanha. No caso de nossa Universidade com as Universidades da Galícia há um relacionamento muito estreito. Porque nós estamos numa zona transfronteiriça, portanto ainda abrangida por programa para o reforço da cooperação entre fronteiras.
Depois, obviamente temos, por uma questão de língua, também relações muito estreitas com as Universidades dos chamados países africanos de língua portuguesa: Angola, Moçambique, Guiné, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe.
Com as Universidades Brasileiras, temos um protocolo estabelecido entre o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e das Universidades Brasileiras; temos muita cooperação bilateral e muito trabalho mesmo. A título de exemplo, minha Universidade está a fazer um curso de pós-graduação, de mestrado, no sul do Brasil, na Universidade de Itajaí.
O desenvolvimento das relações universitárias com o Brasil tem sido muito grande, e o salto qualitativo é passar da cooperação bilateral para a cooperação em rede. Acho que esse é o efeito mais importante; portanto uma cooperação multilateral entre eles. E é por isso que está a caminhar claramente. Quero dizer, por exemplo, que entre os Conselhos de Reitores Brasileiro e Português, no amplo protocolo que assinamos, constituímos uma comissão com três reitores portugueses e três reitores brasileiros, para um acompanhamento permanente de toda esta problemática.

Qual sua opinião sobre o papel social da Universidade num mundo em mutação?
A Universidade do Minho está inserida numa região de grande dinàmica, de pequenas e médias empresas, em grande mutação, que tinha uma falta muito grande de quadros qualificados e onde praticamente, quando tinham um problema mais específico, não havia laboratórios especializados que pudessem ajudar. Creio que a Universidade nasceu numa ótica nacional pelos cursos que oferece, mas muito ligada ao tecido social e econômico da região. Nós temos mais de uma centena de acordos e protocolos de cooperação com empresas, com municípios, com os serviços públicos, para fazer desde ensaios laboratoriais especializados, investigação aplicada, até ajudar a resolver muitos problemas que naquela zona mais ninguém poderia. Portanto, vejo a Universidade com um papel fundamental no desenvolvimento regional, como um motor do desenvolvimento econômico.


SOBRE O FINANCIAMENTO DAS UNIVERSIDADES PORTUGUESAS

El presente texto aclara el concepto de "rácio- padrão" y la necesidad de su aplicación para la distribución de la financiación y para la definición del presupuesto en las universidades públicas portuguesas.

Wilchil Vaz. Unv. Algarve. / Para a maioria da população universitária nacional, o termo ®rácioŻ tem vindo a significar algo de indesejável e geralmente culpável de um grande número de problemas das nossas universidades. Isto deve-se largamente a uma falta de entendimento do que é o ®rácio-padrãoŻ e o seu parceiro, o ®custo-padrãoŻ.
A necessidade de aplicação dos ®ráciosŻ deriva, de modo geral, de uma necessidade de definir o custo orçamental por discente sustentado pela fracção do orçamento do estado dedicada, neste caso, ao ensino superior estatal no nosso país. Pela introdução do custo-padrão, o governo diz às universidades estatais portuguesas que podem contar com uma determinada verba por discente definida em função da área científica e tipo de formação. Definido este custo, a tutela determina ainda a fracção do orçamento que pode ser gasto em despesas com pessoal, tomando o cuidado de indicar um custo médio por docente e não-docente. Este processo leva a um valor que é o ®rácio-padrãoŻ, valor este que explicita o número de discentes inscritos num curso universitário que justificam o pagamento de um funcionário, docente e/ou não-docente. A definição é feita por curso, que é enquadrado numa área científica, leccionado na universidade.
Apesar do facto óbvio que os valores absolutos dos rácios podem ser discutíveis, embora numa base sujeita à valorização subjectiva das partes envolvidas na discussão, considero a aplicação dos rácios uma das grandes acções inovadoras da gestão orçamental do ensino superior em Portugal nos últimos tempos. Pela primeira vez temos clareza sobre aquilo com que podemos contar a longo prazo para a tarefa de ensino superior que nos é atribuída. Pelo menos teoricamente as universidades estatais portuguesas são reduzidas a uma meta comum, visto que o rácio é suposto ser o mesmo para todas.
Existindo uma definição superiormente estabelecida que determina a nossa gestão orçamental, retiraremos uma vantagem tanto mais rapidamente tivermos a inteligência de ajustar as nossas acções aos paràmetros que nos são dados à partida. A metodologia para aplicação do rácio-padrão ao nível das universidades desagrega cada instituição nos diferentes cursos que nela são professados, associando a estes as suas diferentes áreas científicas. Desta forma, o indicador obriga a uma definição clara da estrutura dos cursos por áreas científicas e permite orçamentar cada disciplina ou grupo de disciplinas neles leccionadas de forma objectiva, permitindo ainda uma definição do número de docentes necessários para leccionar cada disciplina ou grupo de disciplinas, sem recursos a opiniões subjectivas e posições de força. Possibilita ainda uma avaliação de eficácia da aplicação dos recursos humanos e estruturais da instituição.
A aplicação do rácio-padrão torna-se pois, quando devidamente utilizado, um instrumento potente, minucioso e eficaz na distribuição justa e eficiente dos recursos da nossa Universidade e dos seus cursos.

* Fonte: Editorial do Boletim Informativo da Universidade do Algarve.


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